O presente que as mulheres precisam no dia 8 de março

O presente que as mulheres precisam no dia 8 de março

O Dia Internacional da Mulher, 8 de março, cresce cada vez mais como data comemorativa fora de época com a alta expectativa do comércio. Ainda em 2016, de acordo com levantamento da FecomercioSP, alguns setores do varejo esperaram faturar 40% a mais em relação aos números registados no ano anterior, 2015. Conforme a pesquisa, chocolate, cosméticos e flores lideraram os pedidos.

Além disso, o próprio mercado parece compreender as generosas necessidades do público masculino. Em entrevista ao portal Terra, Kees Schoenmaker, presidente do Ibraflor - Instituto Brasileiro de Floricultura, confirmou que, em 2023, os produtores colheram cerca de 50% a mais de Rosas em relação a média semanal para o abastecimento em lojas e floriculturas. Ainda em relação ao ano anterior, os varejistas aguardaram um aumento entre 8% e 10% nas vendas de flores para o Dia Internacional da Mulher.

Preocupados em demonstrar felicitações e cercados de expectativas para a data, os homens passaram a optar por presentes a palavras e ações para o dia 8 de março. No entanto, o verdadeiro desejo das mulheres para o Dia da Mulher é outro: a diminuição dos índices negativos que tanto as acompanham há séculos.

Os índices que precisam diminuir

Para o dia Internacional da Mulher, mais do que rosas e chocolates, os homens precisam entender os índices tão traumáticos que todas as mulheres vivenciam diariamente. Só em 2022, de acordo com a Rede de Observatórios da Segurança, o Brasil registrou cerca de 2.423 ocorrências de violência contra mulheres. Além disso, 495 dos casos terminaram em feminicídio. Em resumo, uma mulher sofreu violência a cada quatro horas no Brasil em 2022.

“Existe a necessidade de que todas as pessoas tenham um conhecimento social sobre essas questões para que a gente possa transformar esses números, que aumentam a cada ano”, explicou a pesquisadora Larissa Neves em entrevista ao G1.com.

Os dados sobre a violência contra as mulheres não são negativos apenas no Brasil. De acordo com estudo da The Lancet, 27% das mulheres de 15 a 49 anos sofreram violência doméstica durante algum momento da vida. A autora principal da pesquisa, Lynnmarie Sardinha, revelou como “preocupante” o aumento do número de jovens que sofrem violência dos parceiros. Para ela, a adolescência e o início da vida adulta representam etapas importantes para o amadurecimento. “[são] quando os fundamentos para relacionamentos saudáveis são construídos. A violência que essas jovens experimentam tem impactos duradouros em sua saúde e bem-estar. A violência de parceiros íntimos é evitável e precisa ser feita.", disse ela.

Contudo, os índices sobre violência compõe apenas a ponta do iceberg da desigualdade. Em pesquisa de 2022, o SebraeRS revelou que as mulheres ainda são minoria em posições de empreendedorismo no Rio Grande do Sul. O estudo demonstra um contraste: mesmo em minoria, as mulheres empreendedoras têm melhores índices educacionais em relação aos homens na mesma posição. Outra pesquisa, desta vez do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), reflete sobre o rendimento mensal das mulheres no mercado de trabalho brasileiro.

De acordo com o levantamento, a remuneração feminina é 21% inferior ao rendimento masculino em cargos similares. Mais do que isso: o rendimento médio mensal das mulheres no mercado de trabalho brasileiro é inferior em relação ao dos homens até mesmo em posições nas quais a ocupação feminina é superior. Por exemplo, as mulheres ocupam cerca de 91% das vagas de serviços domésticos. No entanto, recebem 20% a menos do que os homens. Os índices pioram em educação, serviços sociais e saúde. As mulheres recebem 32% abaixo mesmo representando cerca de 75% do total das categorias.

Os estudos demonstram um verdadeiro contraste com a realidade. Um levantamento feito com 1,5 milhão de pessoas revela que as mulheres são mais eficazes do que os homens em posição de liderança. O relatório TheReady-Now Leaders da Ong Conference Board aponta que as companhias com pelo menos 30% de mulheres em cargos de liderança representam 12 vezes mais chances de ocupar a lista das empresas com melhor desempenho financeiro.

O impacto dos índices na saúde mental das mulheres

Descritas com mais empatia em relação aos homens, as mulheres sofrem o impacto dos índices negativos diariamente. Casos de violência e desvalorização profissional causam danos à saúde mental, autoconfiança e relação das mulheres com a própria vida. Em suma, estudos revelam que o estado de esgotamento mental é 25% maior entre as mulheres do que entre os homens. A síndrome de burnout é o principal exemplo.

Em um relatório sobre o assunto, a ONG Think Olga atribui responsabilidade ao número aos seguintes fatores: sobrecarga de trabalho (doméstico, inclusive), pressão financeira e a dificuldade em conciliar vida profissional com o cuidado e a rotina de crianças e idosos. O documento também reflete sobre a sensação das mulheres com a própria vida. Por exemplo, cerca de 86% das brasileiras acreditam ter muita pressão e responsabilidade. Além disso, 48% das entrevistadas também relataram conviver com dificuldades financeiras.

"Estamos sobrecarregadas, e existe uma normalização dessa sobrecarga e dos problemas que ela causa”, explicou Vera Nunes em entrevista à Folha de S. Paulo.

O contexto, não à toa, reflete sobre as condições de trabalho machistas nos quais as mulheres precisam conviver. O Índice Regional de Assimetrias aponta que o ambiente profissional pode afetar os sintomas de saúde mental das mulheres. Criado em 2022 como parte do IPEFEM (Instituto de Pesquisas & Estudos do Feminino), o levantamento revela que as chances de burnout aumentam em até 67% nos casos em que as mulheres precisam conviver em ambientes machistas.

Quanto mais o iceberg se revela, no entanto, mais os índices são preocupantes. Apesar de todos os sintomas de depressão e os problemas com saúde mental, estudos apontam que menos remédios e tratamentos são desenvolvidos para elas. De acordo com levantamento da The Lancet, as pesquisas e os desenvolvimentos de fármacos ainda sofrem com desigualdade de gênero no campo científico.

O levantamento avaliou mais de 11,5 milhões de artigos de pesquisa entre os anos de 1980 e 2016. Como conclusão, a revista aponta que há uma lacuna na ciência entre os estudos que diferenciam as particularidades entre homens e mulheres. Conforme a The Lancet, a maioria das linhagens de células utilizadas em experimentos são, normalmente, masculinas.

O líder da pesquisa, Vincent Larivière, pesquisador da Universidade de Montreal, determina que a exclusão da menção de gênero em experimentos pode prejudicar na elaboração de políticas públicas voltadas às mulheres. Ele também cita problemas com “fornecimento de serviços, saúde e resultados de tratamentos”.

O trabalho invisível da mulher

O desgaste emocional da mulher também acontece por aquilo que foi chamado de “Trabalho invisível” durante a proposta de redação do último Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM). Alunos do Brasil inteiro precisaram escrever uma dissertação sobre “Desafios para o enfrentamento da invisibilidade do trabalho de cuidado realizado pela mulher no Brasil”. Além disso, a proposta também acompanhou um texto com números cujas reflexões impactam na compreensão da trabalho do cuidado que as mulheres desempenham diariamente.

O principal exemplo aparece nas comparações entre a média diária entre homens e mulheres no que diz respeito aos afazeres domésticos. Conforme a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) Contínua 2022, mulheres se dedicam, em média, 21,3 horas semanais aos cuidados do lar e de outras pessoas. A média dos homens é de apenas 11,7 horas.

Em entrevista ao Valor Econômico, a professora Lorena Hakak fundamenta o termo “trabalho invisível” a partir das práticas do dia a dia. Além disso, a também economista e presidente da Sociedade de Economia da Família e do Gênero (GeFam) sugere mais atenção com o tema a partir da pandemia por Covid-19, em 2020.

“É invisível, por exemplo, quando alguém chega em casa e a comida está pronta. Alguém fez aquela comida, ficou duas ou três horas cozinhando, alguém alocou tempo para cuidar de uma criança. Quando vemos uma criança bem nutrida, saudável e feliz, tem alguém cuidando dela e toda a sociedade acaba sendo beneficiada.", disse ela ao jornal.

Como outros exemplo, a Folha de S. Paulo elencou os seguintes modelos de Trabalho invisível da mulher: “Lavar a roupa suja, estender, dobrar, passar e guardar roupa, varrer a casa, tirar o pó, limpar o chão e o banheiro, tirar o lixo, organizar os armários, aguar as plantas, fazer compras, guardar as compras, fazer comida, lavar a louça.”

Ainda de acordo com a reportagem, pesquisadores do FGV Ibre determinaram que o trabalho invisível da mulher, caso computado, acrescentaria pelo menos 8,5% ao PIB brasileiro. Para Hildete Pereira de Melo, mestre em engenharia de produção e doutora em economia industrial e da tecnologia, a economia do cuidado é determinante e essencial para o bem-estar da sociedade como um todo. No entanto, não há a valorização adequada. “Pior do que isso”, ela disse, “serve para limitar o direito da mulher a uma melhor qualidade de vida e a ascender na carreira. O seu tempo livre é dedicado aos outros”.

O que as mulheres querem para o Dia Internacional das Mulheres?

Por mais que os presentes sejam o laço favorito dos homens para celebrar o Dia Internacional das Mulheres, o foco pode ser outro. Ainda durante 2023, o g1.com procurou entender o que as mulheres realmente precisam para (e após) o dia 8 de março.

“Principalmente durante a pandemia da Covid-19, quando as mulheres foram mais exigidas. Precisavam ficar em casa, o que seria o lugar mais seguro, mas, ao mesmo tempo, era onde o agressor estava. O crescimento da violência doméstica, a sobrecarga de trabalho, o estresse – tudo veio num acumulado”,

Disse Domênica Rodrigues, educadora, ativista e assessora de Mulheres da Federação dos Trabalhadores Rurais de Pernambuco (Fetape).

Em 2017, a Revista Donna também ouviu mulheres para entender quais os desejos que ficam em relação ao Dia Internacional da Mulher. Confira:

“Gostaria que mudasse a maneira como os homens nos enxergam na rua, em qualquer lugar que estejamos! Não sou um pedaço de carne! Minha roupa não é um convite! Meu corpo é meu e de ninguém mais! Meu ouvido não é pinico! A minha gentileza não quer dizer sim! Quero "apenas" RESPEITO! Força agora e sempre Mulheres!!”

Patrícia Gomes Nunes

“Gostaria que as pessoas parassem de se espantar quando digo que tenho 3 filhos, parece que os filhos são empecilho, mas não são. Sempre que escuto aquela pergunta "como consegues?", só respondo "parceria".”

Adê Valença

“Celebro todas as mudanças e direitos que as mulheres já adquiriram, a luta pela conquistas de muito mais reconhecimentos. Celebro como as mulheres estão vendo a si mesma com mais valor e vendo as outras mulheres da mesma maneira. Celebro o quanto a gente pode ganhar muito mais quando nos unimos #girlpower”

Priscila Córdova Castelo Branco

“Eu celebro todas as lutas ganhas e merecidas e toda a força que nós mulheres temos sendo mães trabalhadoras e donas de casa! Parabéns pra nós! Orgulho de ser mulher!”

Cláudia Tames

“O dia 08 de março é muito importante para mim, pois as lutas das mulheres para mostrarem sua força e sua não submissão, fizeram com que eu pudesse nascer. Minha mãe é mãe solteira, muito sofreu por isso, mas muito lutou para mostrar que mulher precisa é de um companheiro e não apenas de um homem em casa. Hoje consigo ver que muita coisa mudou e fico muito feliz, vejo muitos pais querendo ser pais, sendo participativos, dividindo ou até mesmo tomando conta da casa para que a mulher possa sair de casa para trabalhar, estudar e lutar pelos seus sonhos. Infelizmente, ainda temos muito que lutar, ainda temos muito preconceito e estigmatização, ainda vemos muita mulheres não podendo decidir seu tipo de parto, ou sofrendo violência obstétrica. Mas, graças a Deus, muita coisa mudou e temos muito a celebrar.”

Sabrina Donatti Bruno

Pharmadhermos

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